No Cras Karajá I, localizado no Jardim Aureny III, em Palmas, o dia 14 de maio foi mais do que uma simples terça-feira. Foi um marco na vida de Jennifer Monteiro da Costa, 39 anos, mulher trans e em situação de rua, que pela primeira vez sentiu o peso da invisibilidade dar lugar ao direito de existir com dignidade. Ela é uma das centenas de pessoas que participaram da Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se, mobilização nacional que tem transformado a realidade de quem vive à margem da documentação — e, consequentemente, da cidadania.
Ela já é atendida pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e, durante o Registre-se, recebeu orientações da Defensoria Pública do Estado (DPE) para poder dar entrada ao processo de mudança de nome no Registro Civil, junto ao cartório de sua cidade de origem, no Pará. Além disso, ela saiu do Cras com sua segunda via da certidão de nascimento, e a nova Carteira de Identificação Nacional (CIN), ainda com seu nome de batismo, mas que garante a ela a possibilidade de planejar uma vida melhor.
Jennifer chegou cedo, otimista, carregando no peito um sonho antigo: ter seu nome social reconhecido nos documentos. “Sempre fui humilhada, chamada por nomes que não me representam. Passei vergonha em postos de saúde, filas, entrevistas. Hoje, estou sendo chamada de Jennifer. Eu sou a Jennifer. E agora sim, sou alguém reconhecida pela sociedade”, disse, com um sorriso que misturava alívio, orgulho e esperança.
E a mudança não parou no papel. Com a documentação correta, Jennifer conseguiu um novo emprego — o primeiro passo concreto para virar a página de uma vida inteira de exclusão. “Com meu nome certo, posso trabalhar, me apresentar como sou. Isso muda tudo”, afirmou.
“Também já vou ter a oportunidade de ir pra um cantinho só meu, porque vou receber um vale pra alugar uma casinha. E aos poucos vou ser ainda mais feliz!”, contou, emocionada.
No Cras, Jennifer não foi exceção. Casos como o dela mostram o impacto de um programa que vai além da burocracia: devolve dignidade. O Registre-se não entrega só documentos, ele entrega pertencimento, reconhecimento e o direito de sonhar com uma vida melhor.
Mas ela não foi a única a sair do Cras com a vida tocada pelo programa. Dona Cleidimar Bezerra da Silva, trabalhadora de 43 anos, é outra que carrega nos ombros uma história de amor e resistência. Mãe de 19 filhos – entre biológicos e adotivos – ela se viu responsável por mais oito quando perdeu a irmã. “Achei que não ia dar conta, mas Deus foi me dando força”, conta.
Hoje, com todos os filhos finalmente documentados, ela respira um pouco mais aliviada. “Tirar identidade sempre foi um bicho de sete cabeças pra mim. Tanta burocracia. Mas esse programa me ajudou a organizar grande parte das minhas preocupações. Saio daqui com tudo certinho e o coração tranquilo”, diz, enquanto recebe o abraço coletivo da criançada.
O Registre-se não entrega apenas documentos. Ele devolve aquilo que há muito tempo foi negado a muita gente: o direito de pertencer. De ser chamado pelo nome. De existir no mundo com dignidade.
Próximos locais
Quinta-feira (15/5) – Cras Krahô (1.304 Sul)
Rua 8, QI 6, 1.304 Sul – Centro
Sexta-feira (16/5) – Cras Kanela (407 Norte)
Alameda 01, Lote 07, 407 Norte
Para ser atendido, basta comparecer ao local com os documentos que possuir. Caso não tenha nenhum, é importante informar, no mínimo, o nome dos pais e o local de nascimento ou de registro.
São parceiros do Poder Judiciário do Tocantins nesta mobilização o Governo do Estado, Prefeitura de Palmas, Ministério Público do Estado, Defensoria Pública, OAB Tocantins, Associação de Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), delegatários dos cartórios de Registros Civil de Pessoas Naturais de Palmas e Conselho Municipal das Associações de Moradores e Entidades Comunitárias de Palmas.