Eram 6h30 da manhã, e diante do prédio do Tribunal de Justiça do Tocantins, um mar de camisetas azuis se movia expectante, como se todos aguardassem o mesmo sinal para despertar. O vento era leve, o asfalto ainda frio, e o coração, ah, o coração, já corria antes mesmo de o corpo partir.
É a minha segunda Corrida da Justiça, e ainda assim aquele frio na barriga insiste em me acompanhar, como um lembrete de que cada largada é uma nova estreia. Ao meu lado, colegas de trabalho e rostos conhecidos sorriem, trocam alongamentos, piadas e falas de “o importante é chegar até o fim”. No fundo, ninguém está ali para disputar com o outro. A meta não é o pódio, é o percurso.
Inicia a contagem regressiva, e de repente um pelotão de superação, desafios, esperança e propósito começa a marchar num ritmo contagiante. A primeira curva é pura poesia. A cidade ainda acordava, preguiçosa. Há quem grite “bora!”, como se cada palavra fosse combustível.
O som das passadas é o mesmo para todos. Alguns correm sozinhos, outros em dupla, outros em grupo. Há quem corra sorrindo, há quem corra em silêncio, brigando com o próprio cansaço.
Um trecho de subida me faz questionar por um instante o que estou fazendo ali. Mas logo ouço uma voz próxima: “Vamos lá, galera!”. O incentivo é coletivo e naquela fração de segundo, parece que todos correm dentro do mesmo coração.
Logo adiante, um baterista no meio da rua transforma o esforço em festa. O som dos tambores se mistura ao barulho das vozes que surgem do nada: “Bora!”, “Olha a foto!”. Voluntários oferecem copos d’água gelada, e aquele gole simples parece uma promessa de continuidade.
Entre passos, vozes e pequenas vitórias
Quando entro na Avenida Teotônio Segurado, vejo uma multidão azul se espalhando pelo asfalto. É impossível não sentir orgulho. A sensação é de pertencimento, como se cada gota de suor fosse uma assinatura simbólica de quem acredita em si mesmo.
No próximo quilômetro, o corpo já reclama, e é aí que a corrida começa de verdade. Um colega passa por mim e acena. Outro grita “força!”, e mais adiante alguém brinca “espera por mim!”. Sorrio sem fôlego. Descubro, mais uma vez, que não estou sozinha.
O vento seco de Palmas sopra palavras invisíveis de incentivo. Correr, percebo, é conversar consigo mesma em movimento.
O percurso de 5 km tem gosto de reencontro. De um lado, servidores, magistrados, estagiários; do outro, atletas de elite, corredores da comunidade e pessoas com deficiência. Cada um com sua história, cada um com sua motivação.
Faltando poucos metros, o cansaço se transforma em leveza. O corpo pede pausa, mas o coração não permite. À frente, o portal de chegada brilha como uma promessa de renovação, de vitória, de vida em movimento.
Pessoas batem palmas, outras apenas olham e sorriem. Sinto o calor humano antes mesmo de cruzar a linha.
Cruzo a linha sorrindo, ofegante e grata. Recebo a medalha e sinto o peso simbólico dela nas mãos. Mais do que metal, ela carrega memórias e significados.
Descubro que o melhor da corrida não foi o tempo que fiz, algo em torno de 38 minutos, mas o tempo que vivi entre cada passo. Porque correr, no fim, é celebrar o corpo que resiste, o coração que insiste e o espírito que segue.
E ali, cercada por colegas, amigos e desconhecidos, percebo que a Corrida da Justiça é um evento esportivo e um lembrete silencioso de que a vida também é uma linha de chegada que se conquista em movimento.