
Cresce o número de negócios liderados por pessoas LGBTQIAP+ na capital tocantinense; O incentivo é a chave para alavancar os números do empreendedorismo.
*Esta matéria possui recursos de acessibilidade para pessoas com deficiência (descrição e legendas).
Há três meses, a Rainbow Barbearia, localizada na região norte de Palmas, virou um reduto para lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queers, pansexuais, agêneros, pessoas não binárias e intersexo, e porque não, heterossexuais (clique aqui para entender melhor o que significa cada sigla). Todos que desejam dar um “tapa no visual” serão bem-vindos. É o que Eiden Luz Ferreira, de 24 anos, dono da “Barber Shop”, defende. O estabelecimento é a primeira barbearia LGBTQIAP+ de Palmas, nascida como uma forma de sobrevivência de quem estava sem emprego.
“A Rainbow começou por questão de necessidade. Eu passava fome, passava muito perrengue mesmo. Eu vi que precisava de um foco, consegui observar ao meu redor e percebi que a barbearia era um ramo para mim. Eu me sentia satisfeito em cortar cabelos”, conta o barbeiro.
A necessidade de criar um espaço seguro para a população LGBTQIAP+ também pesou na hora de abrir as portas da barbearia. “Meus clientes iam a outras barbearias e eram discriminados, não tinham conforto e não eram tratados como realmente se deve”, relembra Eiden Luz.
Caio Alexandre Sousa Ramos, de 21 anos, desenvolvedor de sistemas, conheceu a Rainbow por meio de um amigo e virou cliente fiel. “Aqui eu me sinto seguro e o ambiente é leve. Sempre fui a salões heteronormativos e sempre tinha que dosar a forma como eu me comportava nesses ambientes. Eu tanto volto sempre, quanto recomendo aos meus amigos”, ressalta o cliente.
A diversidade na barbearia se estende também a quem atende os clientes. “Além de mim, homem trans, a Idaiá Maria (mulher trans) é trancista e química geral. O namorado dela, também homem trans, nos ajuda com a parte de marketing e de redes sociais. Futuramente, assim que conseguir expandir a barbearia, eu pretendo contratar mais pessoas”, sonha o barbeiro.
Oportunidade que nasceu do dia-a-dia
Karoline Vitória Assunção Costa, de 23 anos, também se viu sem saída após perder o emprego de recepcionista. Após enviar diversos currículos e não conseguir colocação no mercado de trabalho, ela investiu o dinheiro recebido como acerto do antigo trabalho. Depois, arrumou as malas e foi para Goiânia. De lá, trouxe as primeiras peças da loja, batizada pela empreendedora de Accio Prata. “Quando eu percebi que eu teria que voltar para a casa dos meus pais, coloquei a mão na massa. Comecei a pesquisar sobre o que seria mais a minha cara, o que eu gostava. Como muita gente perguntava sobre onde eu comprava meus anéis, brincos e colares, decidi que esse seria o ramo perfeito para investir”, conta Karoline.
A empreendedora contou com os amigos, em sua maioria gays e lésbicas, na compra dos primeiros produtos. Um incentivo que ajudou na continuação do negócio. “No primeiro mês, todo mundo comprou para ajudar. Eles postaram nas redes sociais, ajudaram a movimentar o Instagram, participaram do sorteio do Dia das Mães”, lembra a empreendedora.
E é nas redes sociais, por meio do Instagram e WhatsApp, que a Karoline realiza as vendas. Ela sonha em conseguir abrir a própria loja e, assim como o Eiden, gerar empregos e renda para mais pessoas. “Para quem é LGBTQIAP+ o mercado é muito maçante. A gente não escolhe no que vai trabalhar. É o emprego que escolhe você. Sem falar do preconceito. Eu saí de casa bem cedo por conta da minha orientação sexual e tive que me virar. Sabendo disso, porque vivi na pele, é que acredito que posso, no futuro, empregar pessoas com a mesma realidade que a minha”, idealiza Karoline.
A triste realidade dos dados
Assim como o Eiden e Karoline, a maioria dos cidadãos LGBTQIAP+ enfrentam dificuldades no mercado de trabalho. Segundo o Observatório Sobre a Empregabilidade LGBT, publicado em 2020 pelo partido Cidadania, que ouviu mais de mil profissionais LGBTQIAP+ e heterossexuais em todo o país, metade dos que se declararam gays assumiram sua orientação sexual no ambiente de trabalho. No Brasil, estima-se que apenas 4% das pessoas travestis possuem emprego formal, segundo um levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Para a instituição, “a falta de maiores dados oficiais sobre a população dificulta a criação de iniciativas voltadas para uma inclusão efetiva”. O pesquisador e militante LGBT, Vinicius Martins Jaime, ressalta a necessidade de políticas públicas para fomentar a empregabilidade nessa comunidade. Confira o vídeo.
Em relação ao empreendedorismo, o Brasil ainda não possui levantamento que descreve, por meio de dados, a orientação sexual ou identidade de gênero dos empresários. Porém, dados da Associação Brasileira de Startups (Abstartups) apontam que, das mais de 13 mil startups do país, apenas 3,9% delas possuem fundadores declaradamente homossexuais. Já nas outras siglas, o índice é ainda menor, sendo 1,5% de bissexuais, 0,1% de transgêneros e 0,2% de outra orientação sexual ou gênero.
Oportunidade vinda da própria comunidade
Mesmo com os números baixos, na capital tocantinense existe uma iniciativa que busca alavancar os números de empreendedorismo LGBTQIAP+. A Associação Anglicana de Solidariedade do Cerrado (Asas do Cerrado), que tem como fruto a Casa A+, possui um projeto denominado Empodera Mais. A iniciativa tem o apoio da UNAIDS, Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a Comissão de Diversidade Sexual da OAB Tocantins, a Igreja Anglicana do Brasil e a Prefeitura de Palmas, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Social. Para o coordenador da Casa A+, reverendo Geraldo Magela, a iniciativa busca dar apoio a uma comunidade que geralmente não encontra essa ajuda em outro lugar.
“Muitas vezes os cursos profissionalizantes ou a entidade que promove ações de empreendedorismo não são lugares seguros. A comunidade LGBTQIAP+, sobretudo as transexuais e travestis, não se sentem seguras em frequentar ou percebem que aqueles ambientes são locais que não oferecem segurança e acolhimento específico a elas. É preciso ressaltar que não estamos falando em prioridades ou tratamento especial, mas sim de acolhimento desse público no que diz respeito ao gênero e à sexualidade.
A primeira edição do Empodera Mais ofereceu cursos no ramo da beleza como de cabeleireira e maquiagem. Toda a capacitação durou dois meses (entre outubro e dezembro de 2021) e os cursos foram escolhidos por meio de uma pesquisa com as pessoas interessadas. Em uma das ações, voltada ao público em geral, 25 pessoas foram beneficiadas através da promoção do Workshop de Empreendedorismo e Planejamento Financeiro.
Nove pessoas concluíram os cursos oferecidos e estavam aptas a empreender ou trabalhar na área; três empreendimentos foram iniciados com montagem de salão de beleza, a partir do que foi aprendido na capacitação; uma pessoa conseguiu vaga no mercado de trabalho associada a um estúdio de beleza já existente; e três criaram empreendimentos que atendem na casa do próprio cliente.
Uma das pessoas que conseguiu seu espaço no mercado, por meio do projeto, foi Jéssica Lorraine, cabeleireira. No vídeo abaixo, a profissional conta como foi a experiência e os frutos adquiridos por meio da iniciativa. Confira.
A Associação Asas do Cerrado vem buscando parcerias para realizar a nova edição do Empodera Mais, além de realizar o acompanhamento de quem passou pelas capacitações. “A gente agora está buscando junto ao Sebrae, Governo do Estado e Prefeitura de Palmas o apoio para que possamos, com trabalho conjunto, promover mais vagas, mais cursos profissionalizantes”, conclui o reverendo Magela.
O projeto recebeu o Prêmio Janaína Dutra, criado para homenagear instituições que apoiam, promovem e protegem a comunidade LGBTQIAP+ nos estados do Tocantins e Goiás.
No texto do post se lê: Casa A + recebe do IBDFAM – TO | Prêmio Janaína Dutra. No IV Fórum da Diversidade Sexual e de Gênero do IBDFAM TO/GO. O sentimento é de felicidade e gratidão por recebermos tão honrado prêmio. Esta placa simboliza uma luta constante da Associação Asas do Cerrado através da Casa A+ em Palmas – TO junto a comunidade LGBTi+ em nosso Estado do Tocantins. Reafirmaremos sempre a união com todas, em busca de um Tocantins livre do preconceito e o fortalecimento do nosso Estado, aonde o afeto, seja uma marca característica para todas que aqui ajudam na construção desta linda e amada terra. Agora vamos conhecer sobre a Janaína Dutra. Janaína nasceu em Canindé, no interior do Ceará, em 30 de novembro, e morreu em decorrência de um câncer de pulmão, em Fortaleza, em 2004. Ela foi a primeira travesti do país a obter uma carteira profissional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Post disponível em: https://www.instagram.com/p/CecVzQ9uqNH/)
A ajuda de quem é especialista no assunto
Essa ajuda que a Associação Asas do Cerrado busca, o Sebrae Tocantins pode oferecer, por meio de capacitações e cursos, muitos deles gratuitos à toda a população, como detalha o gerente da Agência de Atendimento do Sebrae em Palmas, Amaggeldo Barbosa. “O Sebrae está de portas abertas para capacitar o empresário, independente da identidade de gênero ou orientação sexual. Nós lidamos aqui com boas ideias e a vontade de ter o próprio negócio. Nosso foco é o empreendedorismo. É de grande importância irmos até onde essa população está e levar os nossos serviços”, reforça Barbosa.
Além das consultorias, aspirantes ao empreendedorismo podem participar de diversas atividades oferecidas de forma gratuita pelo Sebrae. A instituição acompanha o interessado na abertura do CNPJ, sendo ele microempreendedor individual. Veja como é simples se formalizar.
(Texto presente do vídeo)
Como se tornar um microempreendedor individual
1º passo
Atender às condições para se tornar um MEI
• Não ter participação em outra empresa como sócio ou titular;
• Faturar até R$ 81.000 por ano; e
• Exercer as atividades permitidas. É possível registrar uma ocupação principal e até 15 secundárias.
Confira a lista completa de atividades permitidas ao MEI no Portal do Empreendedor.
2º passo
Criar sua conta Gov.br
No Portal do Empreendedor, no serviço de formalização de MEI, clique em “Quero ser”. Em seguida, selecione “Formalize-se” ou “Gov.br”.
O cadastro no Gov.br permite acessar diversos serviços públicos digitais sem precisar se deslocar, permanecer em filas, imprimir ou autenticar documentos.
3º passo
Completar seu cadastro no Portal do Empreendedor
É hora de preencher o cadastro no Portal do Empreendedor. Clique no botão “Formalize-se”, informe os dados da sua conta Gov.br e autorize o acesso aos seus dados pelo Portal do Empreendedor – Área do Usuário da Redesim.
Preencha o número do recibo da sua declaração de imposto de renda ou do título de eleitor e o número do seu telefone celular. Você receberá um código SMS.
4º Passo
Definir nome fantasia e atividades
Informe o nome fantasia de sua empresa e selecione as atividades que irá realizar.
Também deverá ser informado onde irá atuar: em casa, em endereço comercial, como ambulante, porta a porta ou via internet, por exemplo.
5º Passo
Definir endereço
Informe o CEP do endereço residencial e o CEP do local onde irá funcionar a empresa.
6º passo
Emitir o Certificado de Condição de Microempreendedor Individual (CCMEI)
Após ler atentamente, o empreendedor deverá selecionar todas as declarações obrigatórias para o MEI. Será emitido o Certificado de Condição de Microempreendedor Individual (CCMEI), que comprova a inscrição como MEI, com o CNPJ, número do registro na Junta Comercial e alvará provisório de funcionamento.
O gerente do Sebrae detalha no vídeo abaixo as garantias que o microempreendedor individual tem ao escolher se formalizar. Confira.
Os comentários estão fechados, mas trackbacks E pingbacks estão abertos.